Contra os ladrões, marchar, marchar... com o “Bloco do Pacotão”


O escândalo no Distrito Federal

A situação em Brasília está explosiva. Uma série de escândalos de corrupção ao mais alto nível no Distrito Federal levaram o chefe do governo, José Roberto Arruda, para a prisão; vários dos mais altos responsáveis políticos estão em vias de seguir o mesmo destino.



Segundo o que terá já sido apurado, “Arruda é acusado de comandar um esquema de propina que tinha como beneficiários deputados distritais, assessores e empresários, de acordo com as investigações da Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal.
1 - O governador do DF, José Roberto Arruda, teria montado uma estrutura para arrecadar dinheiro de empresas fornecedoras do seu governo.
2 - A estrutura teria sido concebida pelo próprio Arruda através de uma planilha.
3 - A base do esquema estaria concentrada nas secretarias de educação e saúde e em contratos de serviço de informática do governo.
4 - Durval Barbosa seria um dos principais arrecadadores do esquema, indicado pela função pelo próprio Arruda.
5 - O gabinete de Durval teria se transformado num caixa de banco, procurado por diversas pessoas em busca de dinheiro vivo.
6 - Esta estrutura de corrupção beneficiaria assessores diretos do governador, deputados distritais e outros aliados.
7 - O governador José Roberto Arruda seria o maior beneficiário do esquema. Ele nega.
8 - O vice-governador Paulo Octávio foi citado como outro beneficiário do esquema. Ele nega.
9 - Oito secretários ou presidentes de órgãos do governo foram citados como beneficiários do esquema. A maioria foi exonerada.
10 - Nove deputados distritais ou ex-deputados foram citados como beneficiários do esquema.
11 - Os parlamentares são acusados de receber dinheiro em troca de sustentação política.
12 - O próprio presidente da Câmara seria beneficiário do esquema.
13 - Pelo menos um conselheiro do Tribunal de Contas do DF, encarregado de aferir a boa aplicação dos recursos públicos, estaria envolvido no esquema.
14 - Até a entidade filantrópica da mulher do governador foi apontada como beneficiária do esquema.
15 - Pela primeira vez na história, o grosso das denúncias se baseia de filmagens que mostram autoridades de Brasília e o próprio Arruda manuseando ou recebendo dinheiro.”


Prevê-se a abertura de processo por “falta de decoro parlamentar” contra três deputados - Leonardo Prudente, Eurídes Brito e Júnior Brunelli, que aparecem nos vídeos a receber maços de notas do ex-secretário de Relações Institucionais do Distrito Federal Durval Barbosa.


Uma das características deste escândalo, que o torna tão especial e popular, é a existência desses vídeos com os actos de recepção e distribuição do dinheiro, que depois é guardado nas cuecas, nas meias, na mala. Há mesmo quem reze, agradecendo ao pagador. Verdadeiramente, só visto. O que pode ser feito em:

Não perca os grandes êxitos, todos disponíveis no mesmo site:
Escândalo no DF
Alcir Collaço coloca dinheiro na cueca
Prudente esconde dinheiro na meia
Odilon Aires: ‘Isto aqui é o paraíso’

Os vídeos foram anexados ao inquérito da Polícia Federal, que desencadeou a operação Caixa de Pandora na última sexta-feira antes do Carnaval, resultando no cumprimento de 29 mandatos de busca e apreensão em gabinetes de órgãos públicos, residências e empresas.

São alguns dos momentos desses vídeos e deste caso que são motivo das marchinhas dos blocos carnavalescos.



O Bloco do Pacotão

Marchei neste Carnaval com o Bloco do Pacotão, tido como o bloco carnavalesco mais tradicional e irreverente de Brasília. É conhecido pela sátira política - em plena ditadura militar (1964-1985) "homenageou" os generais ditadores e presidentes Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo.


Conta-se que a ideia do bloco foi germinando nos botequins da Brasília no fim da década de 70. O fascista Geisel tinha imposto o chamado "Pacote de Abril", leis que, entre outras coisas, fecharam o Congresso e criaram os senadores "biônicos". O bloco nasceu formalmente no verão de 1978 no Clube da Imprensa, frequentado por jornalistas, artistas e estudantes, com o pomposo (como convém) nome oficial de Sociedade Armorial Patafísica Rusticana, conhecida como Pacotão.

“Não era um clube chique, - diz um dos fundadores - era todo de madeira, mas reunia a elite intelectual da época. Isso incomodava”. Hoje mantém, orgulhosamente, “a alegria de um bloco pouco documentado, sem certidão passada em cartório ou firma reconhecida por Deus.”


Dizem que "como forma de protesto, o trajeto é feito sempre pela contramão. Os foliões costumam acompanhar a bagunça pelas pistas das W3 Norte e Sul, que atravessa todo o Plano Piloto e é uma das mais tradicionais avenidas de Brasília. Há também crianças, mulheres, gente fantasiada. São comuns os músicos, anônimos, se misturarem à multidão. Todos os anos, o Pacotão é assim.”

O percurso deste ano, desde a popular rua W3 Norte até à Asa Sul (a nomenclatura das artérias de Brasília tem um sistema muito peculiar), foi também feito em contramão, claro, explicando os bloquistas que “andar na direção contrária é uma tradição para o Pacotão já há 32 anos”.

Lê-se em Brasília que “O Pacotão é um bloco irreverente, autêntico, sem organização, sem a mínima ordem." Junta anjos e demónios.



Talvez por isso tenha parado em frente ao Hospital Sarah Kubitschek, onde uma série de doentes em camas e cadeiras, assistiam ao desfile no jardim.


O bloco tocou várias músicas e saudou a instituição que se mantém como uma referência de serviço público aos cidadãos, nestes tempos em que os grandes dos negócios tentam ganhar dinheiro à custa dos doentes.



As marchinhas

Com a prisão do governador na sexta-feira, não foi fácil em tão curto prazo fazer as letras das marchinhas, as camisolas, as faixas. Um dos fundadores do bloco e integrante da Comissão Desorganizadora, o cartoonista Joca Pavarotti, protestou contra esta falta de tempo para preparar o Carnaval, dizendo “somos jornalistas, trabalhamos em cima da notícia, mas desta vez fomos atropelados pelos acontecimentos, devíamos ter sido comunicados antes sobre a prisão de Arruda”.

Outro dos organizadores do desfile explica a simplicidade e rudeza das mensagens: "O bloco funciona como desaguador da insatisfação do povo, o escândalo do Arruda é nacional. Não usamos retórica, a ideia é cutucar a onça com vara curta mesmo". Como se pode constatar nestas marchas:

Ali Arruda e os 40 Durvais
(de Amâncio do Teclado)

Ali Babá não é mais quarenta não
Agora tem Arruda e a gangue do Mensalão (BIS)

Lá na Papuda já não tem mais condição
Pra guardar tanto bandido é ladrão (BIS)

Meia, cueca e panetone
Essa quadrilha rouba mais que Alcapone


Arrombaram a caixa de Pandora
(de Joka Pavaroti)

Fora, fora, fora Arruda!
Não adianta, chorar de novo
Arrombaram a caixa de Pandora
O povo está na rua, gritando Arruda Fora!
Rouba aqui, rouba acolá
Todo mundo metendo a mão
Após arrombar o cofre
Os meliantes ainda fazem oração

O careca é sua ganguê
Vão ter uma bela ceia
Arruda põe na sacola
Prudente esconde na meia

Durval botou a boca no trombone
Arruda cara de pau diz que era pro Panetone


Deu Pane Tony!
(de Garrincha, Derez e Paulo Chapa)

Alô Tony o Governo deu pane
Deu pane Tony deu paaaane

Deu dindim na meia véia
Deu bufunfa na cueca
Deu imagem de ladrão
Rezando aquela oração!

Alô Tony o Governo deu pane
Deu pane Tony deu paaaane

Ano de copa e eleição
Da carnaval com mensalão
Este homem - que bravata-
É um bandido Democrata!


O Carnaval chega ao fim. A noite está amena, mas amanhã é quarta-feira de cinzas e a vida volta à sua estranha normalidade.



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