"Combatentes pela Paz"






Publicado em: O Gaiense, 30 de Janeiro de 2010

Dois homens e duas mulheres, ex-soldados de Israel e ex-combatentes palestinianos, estiveram esta semana em Bruxelas apelando à Europa que se empenhe pela paz na sua terra. Insistindo em acender uma chama de esperança no meio do inferno em que se tornou a região, fizeram os seus comoventes relatos de uma vida destruída pela guerra.

O palestiniano contou como, desde criança, tinha visto a sua rua invadida por estranhos, de que não entendiam a língua, nem sabiam o que tinham contra eles. Como as outras crianças do bairro, começou por levantar bandeiras da Palestina, um acto considerado ilegal, depois atirava pedras aos tanques daqueles estranhos, e depois começou a atirar bombas. Tornar-se um combatente era a forma natural e inevitável de vida da comunidade ocupada. O ódio cresceu quando viu a sua filha de 10 anos ser assassinada por um soldado que nunca respondeu por esse crime. Só lhe apetecia matar a filha de um israelita.

Contou-nos, neste dia em que se comemoram os 65 anos da libertação do campo de concentração de Auschwitz, que um dia passava no cinema um filme sobre o holocausto. Foi ver só para ter o prazer de sentir os seus inimigos judeus a sofrer. Durante o filme, o seu sentimento foi-se transformando. Não conseguia deixar de se sentir solidário com aqueles esqueléticos homens e mulheres esmagados pelos seus carrascos. Chorou e compreendeu o sofrimento dos judeus. Só não compreendeu como era possível que um povo tão sofrido estivesse a fazer algo de tão terrível contra outro povo, os palestinianos, que são hoje os judeus dos judeus, as vítimas das vítimas. Foi com esse turbilhão de dúvidas e contradições que, na prisão, depois mesmo de ter sido torturado e tratado como terrorista, resolveu conversar com o guarda prisional e foi-se apercebendo que ele conseguia compreender. Nunca tinha conversado com um israelita. Nas zonas ocupadas, só se contacta com colonos ocupantes e com soldados armados. É tudo o que conhecem de Israel.

E, do lado de Israel, o desconhecimento provocado pela separação forçada e pela guerra é igualmente absoluto, como relataram os dois soldados israelitas presentes.

Em 2005, criaram juntos o movimento "Combatentes pela Paz", porque descobriram que há gente que se odeia porque não se conhece, porque sofre ignorando o sofrimento do outro lado. É um movimento criado por israelitas e palestinianos envolvidos em acções violentas e que decidiram lutar por uma solução pacífica para o conflito, estabelecendo o diálogo directo entre as populações, por cima dos constrangimentos impostos pelas partes beligerantes. São obviamente muito mal vistos pelos senhores da guerra.

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