O candidato do regime



Publicado em: O Gaiense, 18 de Julho de 2009

Num acordo inédito, quase todos os grupos políticos do Parlamento Europeu decidiram apoiar para presidente da instituição um conservador polaco, Jerzy Buzek, candidato do Partido Popular Europeu que, após a retirada de outras candidaturas com explicações muito pouco convincentes, foi eleito à primeira volta com 555 votos dos 713 entrados na urna.

Deste coro destoou apenas o grupo GUE/NGL, que apoiou a candidatura de uma deputada sueca de esquerda. Apesar de o grupo ter apenas 35 deputados, a candidata Eva-Britt Svensson recolheu 89 votos, tendo havido portanto mais de meia centena de deputados que se recusaram a acatar a indicação de voto dos seus grupos políticos, seguramente alguns verdes e vários socialistas (incluindo portugueses) e mesmo alguns liberais. Houve ainda 69 votos brancos e nulos, e não foi certamente por os deputados não saberem preencher o boletim de voto...

Não era habitual um acordo de bastidores com esta amplitude. Mas, neste início de legislatura, estão especialmente agitadas as negociações para distribuição de cargos, que não são apenas os do Parlamento, mas também os lugares na nova Comissão e eventualmente no Conselho, que poderá vir a ter um presidente fixo escolhido (não rotativo, nem por inerência) se for aprovado o Tratado de Lisboa. Há demasiado em jogo para que as negociações sejam públicas e transparentes. O que não augura nada de bom para a legislatura que agora começa.

Um Parlamento sem grandes divisões políticas, sem uma oposição forte, poderia ainda chamar-se Parlamento? Ou são as diferenças de opinião e a clareza do debate aberto que constituem a própria seiva da democracia?

Há que agradecer aos 89 deputados que tiveram a coragem de impedir que esta eleição na casa maior da democracia europeia se transformasse num mero ritual de canonização, que a desacreditaria ainda mais perante o olhar já tão céptico dos seus cidadãos.

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